quarta-feira, 6 de março de 2019


Ensaio sobre a burrice.

Quando eu era da escola primária, era assim que se definia o “fundamental” de hoje, era comum a gente ouvir as professorinhas falarem com tom docemente didático o paradigmático e politicamente correto (na época não se usava isso) “Ninguém é burro”. Ali estava a gênese do que estamos assistindo hoje no mundo. Aquilo que chamo de “Empoderamento da burrice” ou “Triunfo da burrice”.
Meu pai, durante a minha adolescência, não raramente, me dizia que a Burrice era a maior tragédia humana. E ele fundamentava o que dizia. O Dr. Antonio Coelho, era um respeitado criminalista. Tenho muito orgulho de suas causas defendida com espírito aguerrido. Meu pai me dissera que resolveu se tornar advogado para lutar pelos seus direitos de cidadão e se descobriu um defensor dos direitos de todos. Mas ele dizia que, como criminalista, era muito claro para ele que a burrice estava por traz de esmagadora maioria dos criminosos que ele teve de defender. Disse-me também que os criminosos mais bem sucedidos eram os “certinhos”. Que, desses, deveríamos ter muito cuidado. Papai me ensinou muitas coisas, dentre elas, uma que gosto de lembrar. Dizia que também devíamos ter muito cuidado com quem não torce pra nenhum time, escola de samba, ideologia política ou religião. Afinal torcer por essas coisas loucas nos ensina, desde crianças, a nos apaixonarmos por ideias e isso é um confiável caminho para se aprender a amar, visto que a gente gosta incondicionalmente, irracionalmente e sem desejar nada em em troca a não ser o estranho prazer de desfrutar da sensação boa de estar perto destas coisas.
O Coelhão, o Dr, o Careca, ganhou com isso muitos admiradores e inimigos, com seu jeitão Franco de ser. Eu mesmo me ressenti muitas vezes pela “sutileza” ogra de hipopótamo com que ele agia em situações. Essa é a parte que me ensinou pelo avesso desenvolvendo em mim um tom mais conciliador. Todavia a essência da honestidade ficou aqui arraigada de maneira tal, a me construir como sendo um alicerce de valor inegociável.
Me tornei professor e músico, muito pela influência de minha mãe. Professor porque ela está na linha de educadores, meus irmãos são professores também ou caminham para isso, sobrinhos... meu filho Le Duque Breno, minha filha Mariah Camacho ... 
assim sou este somatório e divisão em média de coisas que me permitiram chegar até aqui com algumas convicções:
1 - a burrice existe. Não é algo relativo e subjetivo incapaz de se concretizar. A burrice se materializa nas tragédias como as de Mariana, Brumadinho, no Ninho do Urubu, nos hospitais, no bêbado que dirige, no traficante, no homofóbico, no racista, no machista, no xenofóbico, no misógino... na intolerância. A burrice mata;
2 - não se trata com reverência a burrice pois ela ganha força com isso pois acaba acreditando que compensa tal atributo;
3 - o constrangimento é profilático e pedagógico contra esse mal latente na humanidade. Gente burra não pode ter dúvida sobre sua burrice em questão. Sobretudo a de que se está sendo burra em determinado momento, sob a pena de inverter a lógica da vida e tornar a humanidade involuida;
4 - a prova do que estou dizendo está em nosso medo de desmascarar os burros diante de tal empoderamento e triunfo de suas hordas militantes das bizarrices toscas das ostentações pragmáticas de empoderados burros.
5 - a sabedoria reside em nossa consciência e aceitação daquilo que não sabemos e burrice não é algo genético. É cultural. Não se deve confundir capacidade e velocidade de pensamento com inteligência. Inteligência e saber jogar a favor de nossas reais necessidades. É compor com a realidade a fêmea de produzir harmonia. Não com a velocidade com a qual vencemos. Isso é esporte olímpico.
6 - Burrice é doença mas tem cura.

Por fim aqui fica o meu protesto à burrice humana e o meu sonho de que o ser não se curve para as máquinas e a inteligência artificiais. Que a natureza evolutiva da nossa espécie sobreviva a essa autodestrutiva e entupida fraqueza de lidar com a nossa própria incompetência. Que tenhamos a humildade de reconhecer a nossa burrice como algo real é perigoso. Algo que deve ser inibido por nos antes que seja tarde. Um brinde a inteligência humana de ser capaz de enfrentar, sem medos, a burrice nossa de cada dia!
Burro bom é burro alto estima baixa, incapaz de assumir cargos de decisão e liderança.  Do contrário a tragédia humana sempre prevalecerá!

Oba: a imagem do post revela muito mais sobre a burrice humana que sobre o animal burro.

Ricardo Le Duque. 23/02/19
Esta semana recebi, pelo Zap, um discurso, desses que vão entrar para antologia das biografias dos políticos brasileiros. Foi um belíssimo e inspirador discurso de Felipe Rigoni. Ele assumiu, nesta legislatura, o cargo de deputado federal pelo Espírito Santo. O jovem político de Colatina falou de sua história e foi precisamente numa parte que me chamou profundamente a atenção! Ele falava de sua superação na condição de ser cego, não de nascença, mas de um mal que o acometera ainda na infância. Ele foi brilhante no discurso que foi pautado na conciliação entre todas as partes da nação, independente de espectro político. O que é muito o que eu defendo e sempre defendi. Falou de, apesar de suas limitações chegara ali naquele ponto: Eleito com oitenta e tantos mil votos e recém formado no mestrado em políticas públicas. Tudo isso já seria uma narrativa antológica mas o que mais me chamou a atenção fora o momento em que ele se deu conta de que era cego.
Ele dissera que estava sempre se valendo de artifícios para superar a sua condição, se vendo como alguém com uma visão desprivilegiada até que, numa aula, o seu colega ao lado lhe disse: Felipe! Você já escreveu três vezes na mesma linha.
Pois bem. Os nossos limites são vários e, sejam ele a visão,  a audição ou qualquer sentido, ou ainda fraqueza moral, distúrbio afetivo... qualquer que seja a limitação o difícil é a aceitação desta condição. Todavia ali reside a chave para a superação. Rigoni, deprimido diante da “toalha jogada”, teve algo fundamental para começar a vitória sobre si mesmo diante daquela derrota. Seu pai.
A figura do pai é emblemática porque é a fonte maior de inspiração, assim como a mãe. Mas poderia ser outra pessoa com tais atributos morais e afetivos. O Rigoni pai disse ao filho algo parecido com aquela máxima “a dor é inevitável mas o sofrimento é opcional”.
Assim Felipe ficou na latência das palavras de seu pai até descobrir na filosofia o significado maior para aquilo. Entendeu que podemos abrir mão de tudo nessa vida, menos de assumirmos a liberdade de nossas escolhas.
Estamos diante de um Brasil cuja última fronteira da esperança foi cruzada. Não há, sequer um brasileiro neste momento que não se sinta como alguém que escreveu três vezes na “mesma linha”. O Cidadão da esquerda, da direita, do centro e de suas subjacentes possibilidades, já se apercebeu que fomos incapazes de enxergar o que é de fato a política dos poderosos neste pais. Estamos diante daquele momento que a toalha de nossa soberba vontade de vencer no ring ideológico é jogada ao chão como quem reconhece a derrota de todos. Cabe-nos tão somente decidirmos se dicaremos como vítimas crônicas de nossas incapacidades intelectuais ou se encontraremos a coragem de não abrirmos mão de nossa liberdade de escolha.  E sobre escolhermos não se tem muitas opções. Ou a gente vai ficar com dedos em riste apontando supostos culpados e reescrevendo inúmeras vezes na mesma linha ou reconhecemos que doravante só nos resta lutar contra os nossos medos e contra aqueles que desejam nos assombrar para obterem vantagens sobre nossas fragilidades. Assumamos as nossas cegueiras e olhemos pelos sentidos que nos sobrarem. Dessa maneira conseguiremos estabelecer um novo horizonte, um novo sentido que possa nos projetar para um país verdadeiramente reconquistado. Mas dessa vez por nós, brasileiros.

Ricardo Le Duque. 22/02/19